Monday, October 23, 2006

Bolas de Berlim

Amasse um pouco de fermento de padeiro com leite morno e alguma farinha. Faça uma bola, dê dois golpes em cruz e deixe aumentar de volume - a cruz tem que ser feita sem hesitações ou o raio da bola não cresce! Ponha aí umas 500 gramas de farinha num recipiente, abra uma cavidade ao centro, adicione 5 colheres de sopa de margarina, não mais que 6 colheres de açúcar, raspa da casca de uma laranja e, amasse tudo muito bem. Junte depois o fermento, 3 ovos, um a um, e o sal, e continue a amassar até que a massa se descole do recipiente. Se for necessário polvilhe um pouco com farinha. Forme uma bola e deixe levedar em lugar aquecido e tapado até que esta duplique de volume. Corte pequenas porções de massa, dê a forma de pequenas bolas e coloque-as, intervaladas, sobre a mesa polvilhada de farinha. Deixe levedar novamente até duplicarem de volume. Depois frite-as em bastante óleo, virando-as de vez em quando para fritarem por igual - atenção que o lume tem que estar no mínimo! Quando as bolas estiverem louras, retire-as, deixe-as escorrer sobre papel absorvente e, enquanto quentes, passe-as por açúcar misturado com canela. Não invente mais nada!, a canela já é mariquice a mais para uma verdadeira bola de berlim. Por fim, com uma faca bem afiada ou uma tesoura, faça uma abertura, e recheie, com ajuda de uma colher, com creme de pasteleiro.
Como se pode verificar pelo receituário anterior, isto não é nada fácil! É mesmo por isso que afirmo, sem intenção alguma de cortar na casaca às bolas de berlim feitas em Berlim, que as verdadeiras bolas de berlim são as que nos fazem as confeitarias do Minho português. Quem já provou uma bola de berlim feita numa destas confeitarias quase que considera um sacrilégio chamarem de bolas de berlim às bolas de berlim de Berlim. As bolas de berlim minhotas são muito mais bolas de berlim que as bolas de berlim de Berlim.
Na sua análise podemos começar pelo açúcar, que nas bolas de berlim de Berlim é fino demais, pastoso demais e branco demais. Dá um aspecto de pãezinho de leite à bolinha de berlim. Descaracteriza-a. Não tem nada a ver! O açúcar das bolas de berlim minhotas é granulado como manda a lei, cola e faz-nos lamber os dedos um boa dúzia de vezes sem que estes deixem de ficar pegajosos. É açúcar a valer. Quando se encosta uma destas bolas de berlim entre os lábios quase que se fica com todos os sintomas da diabetes. Onde é que uma bola de berlim de Berlim era capaz de tal façanha?
A massa frita das bolas de berlim de Berlim também não é de fritura que identifique sem quaisquer equívocos uma bola de berlim. Aquela massa é assim tipo papo-seco de farinha triga. Não vale. Não devia contar. As bolas de berlim do Minho são tão bolas de berlim que a massa frita que dá volume à bola provoca problemas de vesícula só de olhar para ela!
E o creme de pasteleiro? Bem, em Berlim não se lhe pode chamar creme. Não há cremes, há compotas a jarbardarem aquilo a que eles chamam de bolas de berlim. Há de tudo: Baunilha, morango, ameixa, amora, etc.
A própria geometria da bola de berlim feita em Berlim deixa muito a desejar. Não são bolas, parecem-se mais com discos voadores! São achatadas. Não merecem o nome de bolas de berlim mas de discos de berlim, neste caso de Berlim. A bola de berlim é bem portuguesa e nem sequer me tentem convencer do contrário. É escusado! Uma bola de berlim que se preze tem que rebolar no tabuleiro. Tem que ser apanhada, no mínimo, umas três vezes do chão por não se suster no tabuleiro de tão redonda que é. Ora aqui está um bom índice para auferir da qualidade da bola de berlim e para arrematar com esta análise: O número de vezes que o pasteleiro as tem que apanhar do chão por não se conseguirem suster determina, linearmente, a qualidade da bola.

Tuesday, October 10, 2006

Escorpião...

Eu, que sou Escorpião desde pequenino, acabo de receber a infeliz notícia de que tenho o meu ascendente em Virgem. Estou de rastos! Já não sei o que hei-de fazer da minha vida...

Thursday, October 05, 2006

Relativismo

Tudo é relativo, tudo, excepto a descoberta da teoria da relatividade. Einstein, se fosse português, jamais a conseguiria descortinar. Assim, só a descoberta da teoria da relatividade não é relativa. Teoria da relatividade é igual a Alemanha, não há dúvida alguma. Alguém nascido neste Portugal não teria, nesse campo, quaisquer hipóteses. E não tem nada a ver com subsídios e essas tretas de apoio do Estado. “Ai, o Estado não apoia a investigação e o desenvolvimento”… Nada disso! A não descoberta da teoria da relatividade por um português tem tanto a ver com Portugal como a teoria da relatividade tem a ver com a Alemanha.
Numa Alemanha quase totalmente plana fica fácil imaginar o dia-a-dia do Einstein a meter uma mão sobre a testa, á marinheiro sem mar, para olhar a longínqua linha do horizonte, franzindo primeiro um olho, depois o outro, tal é a dificuldade para se enxergar tão longe. O que pode pensar e sentir uma pessoa quando se depara com a linha do horizonte quase em cima do infinito? Pensa no infinito, ora! Pensa e anda ali às voltas para trás e para a frente, sem sair do sítio, até encontrar uma fórmula que o justifique e que o deixe mais seguro em relação à inquietude do tempo e do espaço, em relação à instabilidade do desconhecido.
Um português, sem grande esforço, olha em frente e leva com, por exemplo, a montanha do Gerês ou serra da Estrela nos olhos. E pronto, é o deslumbre! Se há alguma coisa em que pensar nestas situações é na forma de as escalar, de as dominar, de as conhecer, de as ultrapassar, de as desbravar. Não dá muito que pensar. É agir e pronto. A vida existe e está ali vivinha a dar-nos nas vistas e a desconcertar-nos os pensamentos.
Numa grande planície quase nada nos pode acontecer e quando assim é resta-nos pensar em tudo e mais alguma coisa só para entreter. Eh… Já que estamos “práli”, naquele mundo sem fim, vamos lá encher a cabeça de pensamentos. No sopé de uma montanha há sempre a possibilidade de uma árvore cair e nos abrir a cabeça ao meio, de um desmoronamento acontecer sem nos dar hipótese alguma de fuga. Numa planície fica-se a ver, a olhar para o vazio, a divagar, passivo. Se alguma ânsia física nos aflige podemos correr sem nunca chegarmos ao final. E então pensamos: Se conseguirmos correr em direcção à linha do horizonte e voltar mais rápido que a velocidade da luz, chegamos ao ponto inicial “já” no passado! E tem-se uma teoria. Se um português pensa em correr rápido demais corre um sério risco de entrar pelo imenso mar adentro. E é uma maravilha!
A Alemanha tem teorias; Nós temos assombros.
Depois, como é que um português pode entender as estrelas se tem os ramos das árvores pelo meio a perturbarem-lhe a observação e os cumes das montanhas ali quase como a impedirem-no de ver o filme todo?, se tem um mar que as reflecte ainda mais cristalinas? Até mesmo o observador mais atento se perderia na pesquisa. Na planície alemã, durante a noite, vê-se o céu a aterrar na terra para qualquer lado que se olhe, limpinho, “sem espinhas”, sem fim. Uma pessoa deita-se no chão e fica sem ver mais nada que não seja estrelas. E pensa-se no passado. E descobre-se na luz das estrelas o significado do passado. Mas, que interessa ao português o passado se ele só se trama no presente? É por isso que eu estimo a ansiedade, a vivacidade, a fatalidade, a dificuldade, a felicidade, a aflição de ser português feito em Portugal.
O nosso terreno agreste e a excelência do nosso mar justificam, do meu ponto de vista, a não descoberta da teoria da relatividade, mas, o que justificará o resto? Talvez suavidade do nosso clima, ou a ideia preconcebida de que o clima nos condiciona.
Fica a inquietação.